27 junho 2007

Aquele...

Singular, como me disse uma amiga? Excêntrico, como me disse outra?
Quem sou eu?
Eu sou aquele que tá pouco se fodendo pras consequências das coisas. Pra quem me conhece hoje, não acredita que já fui o ser mais tímido do universo.
Comprar algo no mercado era tarefa que me provocava suadeiras e tremedeiras. Chegar em alguém numa balada? Pra mim tinha que cair do céu, bem no meu colo.
Acanhado, não tinha amigos e dava meus brinquedos pras crianças pobres que passavam na rua.
Talvez eu só quisesse que elas entrassem e brincassem comigo...
Tinha o sorriso tímido e o olhar baixo.
Percebi que só perdia com isso.
Hoje eu sou aquele que fala tudo, que ama, que odeia, que reclama, que elogia, que grita quando quer, que briga quando precisa.
Que defende o menor, que se alia ao maior pra ganhar batalhas.
Sou aquele que repete o prato de comida na sua casa se você oferecer, que conquista a sua mãe, que mantém a autenticidade.
Aquele que conversa com o velhinho e tem a paciência de ouvir sobre o século passado do passado.
Que não liga de falar das cagadas que já fez na vida e ri delas, porque sobreviveu.
Que tem um lado espiritual mas não prega religião, porque acha que isso é dos fracos e inseguros que não têm força na própria fé e precisam de seguidores.
Que já sentiu a morte diante dele algumas vezes e a sensação parece ser sublime.
Que hoje chora na frente de quem quer que seja, porque não tem vergonha.
Gosta do tosco e do lúdico. Gosta do humor negro e do lírico. Ama o fútil e o cult.
É aquele que sabe conversar sobre qualquer assunto que não envolva futebol ou dogmas.
Que se compra algo no mercado e está errado, chama o gerente e reclama do funcionário incompetente.
Que ama All Star confortável e terno e gravata que incomodam.
O que ama o diferente, porque o igual vê em forma de sombra em dias de sol.
O que tem a certeza que alguém sempre tem algo a adicionar e dá a chance. Mesmo que o acréscimo venha por algo que passe a odiar. Porque, pra certas coisas, odeia e ama rápido. Volátil, moldado? Foda-se. Gosta do que gosta e ponto.
Aquele que fala de sexo, porque sexo é vida e negar-se a falar da vida é negar-se da vida.
É aquele que guarda mistérios, porque mostrar-se por inteiro faz perder parte do mistério latente que faz as pessoas se atraírem. Quem se mostra todo é vazio e transparente.
Aquele que leva as coisas até o fim, que exagera sempre e que sabe segurar tanto um bebê recém nascido no colo quanto o teu corpo suado do jeito que sabe que vai gostar. E caso você não goste, tem o risco de ele gostar, então boa parte do prazer foi cumprido.
É romântico, gosta de champagne com morangos, mas também gosta do sexo casual por diversão e/ou prazer num banheiro sujo.
É aquele que vai pra balada e beija quantos quiser. Porque odeia cu doce. Se quer, faz, porra!
Se não quer, não faz pra agradar.
Foras? Todo mundo toma e quem disse que nunca tomou está mentindo que nem as pessoas que dizem que nunca mentiram.
É aquele que transa na primeira noite se quiser, liga se quiser sair de novo, não liga se não gostou. É aquele que dirá na sua cara que não vai dar certo e não dá uma de hétero frouxo que deixa de ligar e foge.
Aquele que fala merda no boteco num segundo e em outro discute filosofia com você.
Aquele que sabe o prazer de deitar na areia, pisar descalço na grama, segurar a tua mão. O que ama a Lua e não tem medo de ser chamado de louco. Mas que tem medo de ficar louco.
Aquele que ama piscina e sonha fazer sexo em uma.
Aquele que ama dormir mais pelo prazer de sonhar que pelo descanso em si.
O que entende coisas que ninguém entende e não entende coisas que todos entendem.
O distraído, o míope, o esquecido, porém pontual.
O amigo que você sonha e o inimigo que você não deseja.
O metódico, organizado, simpático, comunicativo, porém chato, individualista, cheio de manias e implicante.
O que fala baixo, mas que sabe gritar quando necessita.
Fica feliz com a felicidade alheia do que merece e tem a mente diabólica para derrubar qualquer um com seus pontos mais fracos, tocando na sua ferida mais recente se você merecer.
É o intenso que beija o cara da balada como se beijasse o amor da vida e empurra o escroto, que nem no beijo sabe ser bom.
É aquele que dá créditos pras pessoas de atitude e que sabem conversar.
Um sorriso lhe encanta logo de cara e isso muito lhe fode.
É aquele que sabe dizer no seu ouvido o que você teria vergonha de dizer olhando o próprio reflexo no espelho.
Aquele capaz de te olhar nos olhos por instantes que ninguém conseguiu.
O que ri mais alto, espirra mais alto e trepa em silêncio.
É aquele que enfrenta a mãe quando o resto da casa treme de medo.
O que discute com a irmã do modo mais gritante dizendo na cara as verdades que todos fofocam em cantos aleatórios.
O que respeita o pai calmo e belo porque ele lhe respeita. Ele o respeita por respeitar seu silêncio em momentos de angústia e que não pede explicações; ele apenas silencia.
É o bom quando você precisa, mas pode ser melhor ainda quando é ruim e você merece.
É aquele que não finge que sabe só pra parecer maior.
É o que dança mais na balada, o que vai pra pista primeiro que todo mundo e não sai de lá até querer. Mas pode perder uma ou mais músicas se você valer a pena.
O que dança de olhos fechados e se transporta pruma dimensão que só os corações puros podem.
É o teimoso, que vai até o fim se achar que está certo. E que, quando não está, diz olhando nos seus olhos que você está certo e te parabeniza.
O que tem a paciência pra certas coisas enquanto quer outras pra ontem.
O que sabe aprender, tem paciência pra ensinar e sabe que obedecer e mandar são dois lados da mesma moeda. Quem não souber fazer um, não sabe fazer o outro.
O que some na balada por razões que nem sabe quais.
O que sabe te fuzilar com um olhar de reprovação se não gostou de você e vira as costas e vai embora sem te dar tchau.
Que te abraça forte na noite que te conheceu se foi com a tua cara.
Que te exclui da vida como uma casca de ferida cicatrizada se você machucou alguém que gosta e te traz pra perto como um irmão se você fez algo nobre.
O que se encolhe quando está triste até vir a cãimbra e se estica logo pra não virar múmia seca sem carne e sangue.
O responsável que sabe levar a sério quando precisa e vira a mesa quando dá vontade.
O que te encoraja, aquele que faz tudo que dá medo, faz a adrenalina subir e explodir num peito de um coração que bate tanto. Mas que ainda apanha também.
O que tem ambições, quer ficar rico, reconhecido, sustentar os pais na velhice e morrer antes dos 60.
Aquele que acha que dinheiro traz felicidade sim, já que a pobreza não traz.
Aquele que ama e não tem vergonha de dizer.
Aquele que já ouviu um eu te amo e não pôde dizer de volta.
O que sofre e não tem vergonha de sorrir. Porque no fundo de alguns poços, há molas.
Que sabe que sempre alguém vai querer te destruir e se esquiva desses.
O que olha o passado e aprende com ele. Com o dele e o dos outros.
Aprender com os erros alheios é válido, mudar pelos outros é estupidez.
Aquele que ama cinema, Clarice, poesia e a voz da sobrinha.
O que parece ter perdido órgãos vitais quando perdeu alguém importante e viu que poderia seguir usando um marca-passo ou uma prótese.
É o inconstante, que sorri hoje e entristece amanhã, mas que jamais te maltrata sem razão. Arranja um canto e não estraga seu programa. Prefere se esconder.
O que sabe sentir canções, que lê com paciência seus textos, que observa atentamente suas fotografias que não participou. E sofre, mas entende que não fez parte e vive com isso.
Que sente ciúmes, mas tem a auto-confiança de saber que ocupa um lugar na sua vida.
Porque o ser humano é grande, cabe todo mundo.
Se não for, não quero espaço.
Não quer ser esmagado em cubículos de pessoas mesquinhas, pobres de espírito e hipócritas.

Um comentário:

débora lopes disse...

No final do texto eu chorei. E lembrei de uma música que diz:


"Você é tão simples e eu chorei."