16 dezembro 2007

Às vezes, sinto-me como se alguns escritores me vissem por dentro. Você lê, se reconhece, se incomoda e procura engolir as letras que decifram seu código de barras, sua carga genética.
Eu entendi a solidão e a amizade do Pequeno Príncipe (O Pequeno Príncipe), as dúvidas em se entregar ao amor de Lóri (Uma aprendizagem ou o Livro dos prazeres), a promiscuidade que se torna fidelidade de Tomas (A insustentável leveza do ser), as inseguranças irônicas de Michael (A maior descoberta de um homem), a cumplicidade do amor e da felicidade e o medo da vida adulta de Michael, Jonathan e Clare (Uma casa no fim do mundo) e a infelicidade por que passam Virgínia, Clarice e Laura (As horas).

Chegou a vez de Henry Miller.
Henry Miller não usou personagens. Não usou pudor. Não usou maniqueísmos de uma hipocrisia barata. Como homem e escritor, ele ousou. Será que ousou mesmo ou a sociedade acredita nisso?
Como todos os homens eu sou o meu pior inimigo. Como muitos poucos homens, porém, também sei que sou minha única salvação (O mundo do sexo, de Henry Miller)

Escrever, em 1940, sobre o sexo fez com que fosse considerado um pornográfico e seu livro proibido em diversos países por anos e todas aquela idiotice que alguns artistas passaram por "ousar".
Na Grécia Antiga, o sexo era considerado algo natural, simples, sem vergonhas. O Catolicismo veio pôr isso em pauta e fodeu o sexo. E fodeu de um jeito ruim.
Proibiu, mas como sabemos "o que é proibido é mais gostoso".
Proibir pode ser a melhor propaganda e achar-se em certas obras faz com que muitas delas sejam ignoradas. Enxergar-se perante o mundo dá medo.
Portanto, o fato de muitas obras serem consideradas desconhecidas não é o fato de elas serem censuradas, proibidas, mas sim por falarem mais de nós mesmos do que se imagina.
Ficar cara a cara com a verdade, com seus maiores podres e fraquezas, dói.
E, muitas vezes, quem enxerga essa ferida em nós, enfia o dedo até criar um fisting de crueldade. Aí está o medo do ser humano se entregar. A qualquer coisa.

Eu já li que "o mundo é aquilo que ele esconde" e se, no século XXI, as pessoas ainda me olham torto quando leio O mundo do sexo nos transportes públicos, é porque o que sonhava Miller ainda está longe.
Seu livros não são pronográficos, pois ele fala da liberdade por meio do sexo, aquilo que une alma e corpo. Ele fala da redenção, de entregar-se totalmente ao que se é.
Muitas pessoas não entendem isso. Acham sexo sujo, promíscuo, vergonhoso.
É como eu digo: sexo é vida e negar-se a falar dele, é negar a vida. Ponto.
Se você não quiser falar da vida, tudo bem.
Mas, pelo menos, viva.
Não se prenda a estúpidos dogmas e moralismos.
Faça e assuma.
Entenda e depois critique.
Assuma sua culpa para poder pedir desculpas.
É a vida.

Esconder-se arás de máscaras lhe renderá um rosto opaco, liso, sem expressões. Nem de choro, nem de felicidade.
Você será a bonequinha de porcelana com buceta cheirando a rosas acreditando que o mundo é todo lindo.
Não.
Ele é lindo num todo daquilo que você faz dele. Cative. Crie. Cultive.

Ultimamente, tenho usado a máscara.
É muito cedo para mostrar-me por inteiro a alguém novamente.
Afinal, sou meu pior inimigo e minha única salvação.
Um dia me salvo.

3 comentários:

Anônimo disse...

ai, fico tão feliz quando Henry Miller toca uma outra pessoa... Pronto, deleite-se que você vai ler uma coisa gostosa atrás de outra agora, e o foda: é tudo a verdade dele e da gente!
ah... <3
suspiro de amor por este cadáver especial que ele é! <3

beijo em vc.

george jung disse...

um dia você se distrai num boteco meia-luz
você se distrai
e não se mostra


não se mostra, mas se vê.
em alguém.

e a casa cai pra todo o sempre.



tipo que se entregar pode doer como nada no mundo
mas a dor ao menos gera blues incríveis

e o risco compensa.
crime perfeito.


belo texto, léo. vou estar lendo a obra, a nível de influência e ninfomania anti-cristã.

Escrevendo pra esquecer disse...

Puts! Perfeito. Eu abro um espaço na minha fome por Débora Lopes e, neste espaço, vou prestar mais atenção, e/em ler você.

Já pensou que quando a gente tenta não se mostrar aí é que a gente fica mais exposto? Pelo menos nossas fraquezas brilham na nossa testa.

Acho que era isso.

Abraço.