sobre pessoas e botecos.

Pedi uma cerveja gelada, uma que era mais barata mas não era tão ruim. Ele foi no banheiro e eu sentei ali no balcão mesmo. Vieram os copos, a cerveja gelada, e eu olhando praquela que era mais cara pensando que preciso de dinheiro.
Eu preciso de dinheiro. Preciso abstrair. Servi os copos e esperei ele voltar - nunca vi um homem demorar tanto no banheiro.

Meus olhos começaram a fotografar tudo que havia ao meu redor. Mais de quatrocentas fotos por minuto, meus deus, o lugar era um cenário montado esperando ansiosamente pela câmera do meu cérebro. Ou seria a câmera do meu cérebro que estava àvida para fotografar todas aquelas milhares de cenas que ocorriam simultaneamente?
Um grupo de cinquentões cantava músicas antigas e bebia cerveja - a mesma cerveja barata que eu estava bebendo. Só havia uma mulher no grupo. Um senhor bigodudo cantou pra ela, segurando seu rosto "Ninguém é de ninguém... tudo passa!" enquanto ela o chamava de safado galanteador. Do outro lado, um casal de lésbicas trocava carinhos mais quentes que o normal pro horário - mas ninguém as percebia, somente eu e minha câmera imaginária. Lá fora, nas mesas, uma mesa cheia de gays, heteros, hippies, moderninhos bossanova.

O lugar era pura diversidade, e eu me senti em casa.

Tomei um gole da cerveja e suspirei. Ele voltou do banheiro, finalmente. Meu cérebro aliviado agora fotografava aqueles olhos, negros olhos, lindos olhos, que me olhavam ansiosamente, e no fundo desses olhos eu sabia que nesses três minutos que ele esteve fora, fotografou com sua câmera imaginária aquele cenário que era só nosso, aquele circo de pequenos horrores tão apaixonante no qual passamos algumas boas horas.